O que está em jogo no mercado de criptomoedas com a aprovação do PL 4.401
O Senado Federal aprovou recentemente o projeto de lei que regulamenta o mercado de criptomoedas (moedas digitais) e criptoativos, caso do NFT’s (Tokens Não-Fungíveis) e stablecoins (ativos do mercado tradicional, como o dólar e o ouro) no Brasil.
Em votação simbólica e sem usar os termos criptomoeda e criptoativos, o PL passou pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado e agora retorna para votação na Câmara dos Deputados. Se não tiver mais nenhuma alteração, seguirá para sanção do presidente Jair Bolsonaro.
Apesar de a proposta ser positiva por dar um passo rumo ao marco regulatório do mercado de criptomoeda no Brasil, a forma simplista que tratou alguns temas relevantes merece atenção.
No Artigo 3º, PL descreve o criptoativo como um valor que pode ser negociado ou transferido por meios eletrônicos e utilizado para pagamentos ou investimento. A expressão “meios eletrônicos” dá margem para representações digitais privadas e/ou não legítimas, possam, ser encaradas como criptoativos, basta lembrar que havia uma PL em que colocava no mesmo patamar tecnológico criptoativos com pontos de sistema de milhas de empresas privadas
Explico: Criptoativos necessitam transitar numa Blockchain, onde se possui ledger (livro de registro público), descentralização, auditoria da transações e incorruptibilidade.
Outro ponto sem senso, é a tentativa flagrante de interferência do Estado na governança das instituições financeiras, trazidas no Artigo 7º e, evidentemente, também é um ponto falho. O Estado pode, e deve, ser informado sobre as transações e os agentes que compõe a gestão das organizações que trabalham com criptoativo, da mesma forma que ocorre com outras instituições do mercado financeiro. Porém, não cabe a ele autorizar as contratações das empresas privadas, nem tão pouco aprovar a incorporação de empresas. Para mim, ficou claro que o projeto confunde direito a informação com interferência para o exercício da atividade.
Há aspectos no PL que também geram incertezas jurídicas. É o caso do Artigo 8º que estabelece que “as instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil poderão prestar exclusivamente o serviço de ativos virtuais, ou acumulá-lo com outras atividades, na forma da regulamentação a ser editada pelo órgão ou pela entidade da administração pública federal indicada em ato do Poder Executivo federal”.
Não se sabe ao certo se o legislador autoriza, as Instituições já autorizadas, ou os bancos a fazerem custódia de criptoativos, ou se imputa que essa entidade da administração pública federal, indicada em ato do Poder Executivo, deveria ficar no guarda-chuva do BC. A meu ver, desnecessária essa citação, uma vez que o projeto já prevê a criação de órgão ou entidade específica. Tal citação só trouxe, desnecessariamente, confusão ao corpo do projeto legislativo.
Nem tudo, porém, são críticas ao projeto. Os artigos 10, 11 e 12, que têm como foco aspectos do direito penal e a criminalização do estelionato e das práticas indevidas com utilização de criptoativos são muito bem-vindos. Concordo que deva estar capitulado no código penal os ativos virtuais com fins de materialidade jurídica para questões delituosas.
Outro ponto importante e que merece elogios é a segregação do patrimônio das corretoras, previsto no Artigo13º, incluída para proteger ainda mais o consumidor.
Vale ressaltar que uma das maiores virtudes das criptomoedas é ser uma moeda digital e não estar vinculada às práticas bancárias tradicionais como, por exemplo, reserva fracionária, na qual os bancos podem pegar parte do capital do depósito de um cliente e vincular a crédito para oferecer ao mercado.
No caso das criptomoedas, o depósito de criptoativo que está sob a custódia da corretora não poderá ser utilizado como capital de custódia para operações privadas, exceto em situações voluntárias, como é o caso do staking. Nesse caso, o cliente faz a locação voluntária do seus criptoativos para as corretoras por um certo período de tempo.
Vale salientar, que estas práticas financeiras usuais dentro das corretoras, como poupança, empréstimos e locações de criptoativos nem sequer foram citadas no PL.
Acredito que o projeto é mais o pontapé inicial para o marco regulatório do mercado de criptomoeda no Brasil, do que o passo conclusivo para a sua operação, considerando que trata de forma genérica sobre a regularidade das empresas que trabalham com criptoativos.
O projeto perdeu a oportunidade de permitir a chancela legal de projetos baseados na tecnologia blockchain como forma de o país crescer em tecnologia.
Basta analisar a “Proposta do Regulamento do Parlamento Europeu”, assinada em Bruxelas, na Bélgica, em setembro de 2020, na qual vemos a preocupação do legislador europeu para que a regulação não venha impedir o avanço da tecnologia.
Esse projeto de Lei poderia ter tratado de criptocommodity, crownfunding por meios de projetos de tokeinização e, até mesmo, legalizado as relações contratuais de smart contracts (contratos entre pessoas criados em blockchains públicas). O Brasil pode se apropriar de tais tecnologias para vencer a falta de crédito no mercado e utilizar as pessoas como agentes dessa transformação econômica! A Blockchain vem para democratizar o acesso da classe média a investimentos em projetos tangíveis e a simplificar e desburocratizar as relações.
*Luiz Góes (CEO LGBANK – especialista em cryptomoeda – é brasileiro, natural do Rio de Janeiro, 38 anos e, atualmente, é CEO da Lyopay, fintech em Dubai, nos Emirados Árabes,