A teoria dos mercados eficientes e a litigiosidade no mercado de capitais
Nos casos de danos causados a investidores, especialmente em situações de fraudes no mercado de capitais relacionadas a falhas informacionais, o Poder Judiciário brasileiro não tem sido a primeira escolha dos gestores de fundos, tanto de forma individual quanto coletiva, para a resolução destas controvérsias. Em contrapartida, a arbitragem tem ganhado espaço como meio preferido, sobretudo por permitir a adoção de conhecimentos específicos, como a Teoria dos Mercados Eficientes, o que facilita uma análise mais técnica e adequada.
O correto entendimento e aplicação da Teoria dos Mercados Eficientes no meio do direito, tende a favorecer o reconhecimento dos danos sofridos pelos investidores, podendo acelerar a identificação de prejuízos e contribuir para a resolução desses casos, promovendo, a longo prazo, o fortalecimento e o desenvolvimento do mercado.
A Teoria dos Mercados Eficientes, inicialmente desenvolvida pelo vencedor do prêmio Nobel de 2013, o economista Eugene Fama, propõe que o mercado de valores mobiliários opere de forma eficiente devido à competição entre os agentes racionais. A principal hipótese dessa teoria é que o preço de qualquer ativo mobiliário, em qualquer momento, reflete integralmente todas as informações disponíveis, sendo, portanto, a melhor estimativa de seu valor intrínseco. Com base nessa premissa, o mercado se ajusta rapidamente às novas informações, garantindo que os preços dos ativos sejam sempre uma representação precisa de seu verdadeiro valor.
Para que o mercado funcione de maneira eficiente e alcance um modelo de equilíbrio, a teoria estabelece três condições essenciais: (i) que não haja custos de aquisição nas operações de compra e venda de valores mobiliários; (ii) que todas as informações relevantes estejam disponíveis de forma equitativa e gratuita para todos os participantes do mercado; e (iii) que os agentes do mercado atuem racionalmente, aceitando as implicações das informações disponíveis para o preço atual dos ativos, bem como das projeções de seus preços futuros. Essas premissas formam a base para que o mercado se ajuste de maneira eficaz e justa, garantindo que os preços reflitam fielmente o valor intrínseco dos ativos.
Ou seja, em um Mercado Eficiente, a competição entre os diversos agentes tende a fazer com que novas informações sobre o valor intrínseco de um ativo sejam refletidas de forma imediata nos preços praticados. Os efeitos das informações recém-divulgadas sobre o valor de um ativo são incorporados instantaneamente ao seu preço de mercado, devido à intensa atividade dos participantes. Como resultado, essa capacidade de ajuste imediato às novas informações implica que as variações sucessivas nos preços dos ativos mobiliários ocorram de maneira independente umas das outras, uma vez que cada preço reflete todas as informações disponíveis até aquele instante.
Nesse contexto, uma das principais discussões jurídicas que surgem, e que podem se favorecer do domínio da referida teoria, é em torno do nexo de causalidade em ações que buscam indenização de danos causados por falhas na disponibilização obrigatória de informações
No âmbito da responsabilidade civil, o nexo de causalidade é um elemento essencial para determinar se um dano foi decorrente diretamente de uma conduta ilícita. Em casos de fraudes ou falhas informacionais no mercado de capitais, a Teoria dos Mercados Eficientes determina que, em um mercado eficiente, as informações errôneas ou omissões causam impactos diretos nos preços dos ativos, prejudicando os investidores. Desta forma, a comprovação do nexo de causalidade em um mercado eficiente poderia ser simplificada, já que se pressupõe que qualquer informação incorreta afete imediatamente o valor dos ativos, criando uma conexão direta entre o ato ilícito (como fraude ou a má divulgação de informações) e os prejuízos sofridos pelos investidores.
Contudo, há uma nuance importante a ser considerada na aplicação da teoria no regime de responsabilidade civil: a necessidade de comprovar o impacto específico da informação incorreta ou incompleta sobre o preço dos ativos. Embora a Teoria dos Mercados Eficientes sugira que os preços refletem de forma precisa todas as informações disponíveis, a fase probatória pode exigir uma análise mais detalhada sobre como, e em que medida, a informação fraudulenta influenciou o comportamento do mercado. Nesse sentido, os debates jurídicos surgem sobre a previsão de se estabelecer um nexo de causalidade direto, especialmente em mercados onde há múltiplos fatores influenciando os preços dos ativos simultaneamente, como eventos externos, variações macroeconômicas e ações de outros países.
Concluindo, a Teoria dos Mercados Eficientes oferece uma base teórica para discutir a responsabilidade civil no mercado de valores mobiliários, facilitando uma argumentação sobre o nexo de causalidade em casos de falhas informacionais. A aplicação prática dessa teoria no campo jurídico, todavia, ainda apresenta desafios, especialmente quanto à exigência de uma prova concreta do impacto de uma determinada informação sobre o preço de um ativo específico. Para que esta abordagem seja efetivamente utilizada em ações de responsabilidade civil, é necessário um desenvolvimento jurisprudencial que reconheça a interconexão entre a teoria e a dinâmica do mercado de capitais, equilibrando a proteção dos investidores e a sociedade.
FONTE: Paulo Roberto Vigna – Advogado, sócio do escritório Vigna Advogados Associados e da VignaTax Consultoria Fiscal e Tributária, Mestre em Relações Sociais do Direito, com MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas – FGV, pós-graduado em Direito Empresarial e em Direito Tributário pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, especializado em Gestão de Tributos pelo Instituto Trevisan (São Paulo).
Inscrito na seccional na ordem dos advogados do Brasil em Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Distrito Federal, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo e em Lisboa- Portugal.
Professor do curso de MBA em Gestão Estratégica Empresarial em São Paulo. É autor dos livros “Recuperação Judicial” e “Manual de Gestão de Contratos” e produz artigos sobre direito tributário, empresarial e tecnologia aplicada a ciência jurídica.