Insegurança jurídica para contribuintes nos depósitos judiciais e administrativos
Nova lei substitui taxa Selic como índice de correção desses depósitos por um índice oficial de inflação
Foi publicada recentemente a Lei 14.973/24 que, dentre outras providências, alterou as regras de atualização dos depósitos judiciais e administrativos feitos em processos envolvendo a União e suas entidades.
Esses depósitos são usados como garantia em disputas judiciais e administrativas tributárias e outros conflitos federais. Assim, caso seja decidido, ao final dos processos, que o contribuinte deva arcar com o cumprimento da obrigação em discussão, o valor que foi depositado no curso do processo é utilizado para a quitação da dívida federal.
Dentre as mudanças trazidas pela nova lei, destaca-se a substituição da taxa Selic como índice de correção desses depósitos por um índice oficial de inflação, a ser ainda definido. Esta nova sistemática só será válida após a regulamentação da lei.
Até lá, o regime que utiliza a taxa Selic continuará em vigor. E é aqui que se iniciam os problemas. A atualização por índice de inflação oficial será, invariavelmente, mais baixa que a taxa Selic (que é composta por correção monetária e juros), o que pode desestimular os contribuintes a realizarem depósitos judiciais para garantir seus débitos federais em futuros litígios.
A nova lei trouxe aos contribuintes algumas dúvidas e certa insegurança jurídica. Primeiramente, tem-se que ainda que ela tenha estabelecido a aplicação da taxa Selic para os depósitos já realizados, e também a aplicação de índice de inflação oficial (provavelmente o IPCA) para os depósitos feitos a partir de agora, sua redação não deixou claro qual o índice mensal a ser aplicado aos depósitos antigos, mas que ainda estão à disposição do Tesouro Nacional.
Um outro ponto a ser destacado repousa sobre o fato de que a alteração do índice de correção dos depósitos poderá levantar nova discussão quanto à incidência do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins sobre a variação dos depósitos que serão corrigidos apenas pela inflação, uma vez que ela, ao que parece, deixará de ter caráter remuneratório e passará a ter caráter compensatório.
Vale considerar que, muito embora essa nova legislação ainda dependa de regulamentação, já é possível vislumbrar inconstitucionalidades em sua redação. Isto porque, deve-se lembrar que o artigo 3º da Emenda Constitucional 113/2021 estabeleceu a taxa Selic como índice aplicável “nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório”, de modo que a nova lei desrespeitaria tal Emenda.
Além disso, ao se remunerar os depósitos judiciais e extrajudiciais federais por índice diferente daquele utilizado para a correção dos débitos federais (taxa Selic), também se desrespeita o artigo 5º, “caput” da Constituição, na medida em que se trata de forma anti-isonômica os contribuintes e a União.
Neste sentido, vale lembrar que o próprio Supremo Tribunal Federal, ao julgar o tema 810, consignou ser inconstitucional a aplicação de índices diferentes de correção monetária e juros para débitos e créditos tributários, o que pode reforçar este argumento.
Devemos ficar, portanto, atentos às normas que regulamentarão esta nova lei que, caso não consigam resolver tais impasses, poderão provocar uma nova onda de processos judiciais, sobrecarregando ainda mais o Judiciário.
Fonte: Jota