Assinatura Digital e seus fundamentos Jurídicos
Um interessante desdobramento dos avanços tecnológicos e da evolução digital para os advogados em especial, é um fenômeno já denominado como “despapelizaçao”, ou seja, a substituição do registro das informações em documentos físicos. De fato, não é de hoje que nas faculdades de direito os livros vêm recebendo versões digitais on line e em nuvens, sendo observado o mesmo movimento no âmbito dos processos judiciais e administrativos. Esta tendência se expandiu, inclusive, para as técnicas de validação e respaldo dos negócios jurídicos, conforme pode ser observado na acelerada adoção das formas digitais de assinatura.
É pertinente destacar, também, que o distanciamento social e as práticas de isolamento da pandemia de Covid-19 aceleraram sobremaneira as negociações e a assinatura de contratos de forma remota, impulsionando a adoção das assinaturas digitais.
O Código Civil já possui várias disposições que conferem embasamento legal para as assinaturas digitais, como por exemplo, o inciso I, do artigo 428, que afirma que são consideradas presentes as pessoas que contratam por telefone, ou por meio de comunicação semelhante.
Na mesma direção, temos o artigo 219, também do Código Civil, que estabelece que as declarações constantes de documentos assinados se presumem verdadeiras em relação aos signatários, e que a doutrina vem interpretando extensivamente para corroborar que a referida presunção abrange documentos eletrônicos, e não somente assinaturas físicas em papel. Tais dispositivos nos permitem afirmar com segurança que nosso ordenamento jurídico endossa o princípio da presença virtual, cada vez mais presente haja vista a vasta disseminação de aplicativos de comunicação remota e portais de compras on line na internet.
É preciso termos em mente, todavia, que existem diversas maneiras de assinatura virtual no mercado, e que algumas diferenças devem ser observadas pelas partes e pelos advogados, considerando a necessidade de se assegurar a máxima segurança jurídica nas negociações e contratos. Inicialmente precisamos compreender como funciona o certificado digital, a tecnologia que permite a assinatura virtual em documentos on line.
O certificado digital é a identidade de uma pessoa real no mundo digital, e fica armazenada em um token, localizado em uma nuvem ou mesmo em um smartphone. De posse de seu token, a pessoa pode assinar documentos de forma eletrônica, bastando conectar o dispositivo de armazenamento do token ao computador, tablet ou smartphone, e digitar sua senha ou acessar sua biometria. Com isso, o documento será assinado digitalmente sem a utilização de caneta ou papel.
É preciso destacar que nem todas as assinaturas digitais gozam da mesma fé pública, e considerando este critério, podem ser classificadas em típicas, as quais possuem seu embasamento jurídico em lei ou em atos infralegais, compreendendo o e-notariado e as assinaturas do ICP-Brasil, e as atípicas, que são todas as demais decorrentes de acordos entre as partes no uso de suas autonomias de vontade.
No que toca as assinaturas digitais típicas, a MP nº 2.200-2/2001 criou a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil, para garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas segura.
O parágrafo primeiro do artigo décimo da MP esclarece de maneira direta que as declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil, presumem-se verdadeiros em relação aos signatários, na forma do art. 131 da Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916 – Código Civil.
Já as assinaturas digitais atípicas são firmadas entre as partes, sendo cada vez mais comuns na realização dos contratos mais simples enviados rotineiramente por e-mail ou mesmo por aplicativos de mensagens, tais como o whatsapp. Tais assinaturas não se encontram no âmbito da ICP-Brasil e não possuem fé pública perante terceiros.
É interessante rememorarmos que as antigas civilizações já detinham a noção de segurança jurídica e fé pública, e que sinais de identificação e chancela pessoal eram adotados muitos milênios antes de cristo. Anéis e selos delicadamente trabalhados com figuras de armas, brasões, criaturas mágicas, animais e letras já serviam para fechar contratos e identificar negócios. Um olhar atento nos mostra que os sinetes e a cera quente utilizados pelos nobres ao logo dos séculos vieram a ser substituídos por tokens e códigos PIN armazenados em smartphones e clouds on line.
A enciclopédia jurídica da PUC/SP nos relata que o primeiro documento a utilizar uma cifragem de proteção, cujas finalidades se assemelham a nossa atual criptografia, foi utilizado pelo Imperador Romano Júlio Cesar, que identificava suas cartas com sua marca pessoal “veni, vidi, vici” – vim, vi e venci. A contar com o ritmo dos avanços tecnológicos, a vitória é de toda a sociedade.