A CONVERSÃO DE DÍVIDA EM PARTICIPAÇÃO ACIONÁRIA NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL COMO FORMA DE INVESTIMENTO

No contexto empresarial, particularmente em cenários onde as organizações se deparam com desafios financeiros significativos a ponto de estarem à beira da insolvência, a liquidação de ativos emerge como uma estratégia viável para satisfazer as exigências dos credores. Nestas situações de crise econômico-financeira, marcadas por um endividamento substancial que pode levar a uma recuperação judicial ou mesmo à falência, os credores podem assumir papéis proeminentes, inclusive exercendo influência considerável sobre as direções estratégicas da empresa

Nesse contexto, um credor influente, ou um consórcio de credores, pode assumir o controle e desempenhar um papel crucial no processo de reestruturação da empresa devedora. A conversão de dívida em participação societária, como estratégia de recuperação, ganhou popularidade nos tribunais brasileiros, especialmente em processos de recuperação judicial de grandes corporações estruturadas como sociedades anônimas.

Antes da promulgação da Lei 14.112/2020, a base legal para a conversão de dívida em participação acionária residia nos incisos VI e XV do artigo 50 da Lei 11.101/2005. Esses dispositivos legais permitiam que o devedor em recuperação judicial realizasse um aumento de capital e emitisse valores mobiliários, tanto para captar recursos para suas atividades, quanto para liquidar, total ou parcialmente, suas dívidas.

Com a reforma da Lei 11.101, introduzida pela Lei 14.112/2020, o artigo 50 foi ampliado para incluir o inciso XVII, que expressamente prevê a conversão de dívida em capital social como um dos mecanismos de recuperação. Segundo estudiosos de referência, como Fábio Ulhoa Coelho, essa conversão é vista como um meio eficaz de recuperação judicial, onde o credor substitui o direito ao crédito por um investimento na empresa devedora, com retorno condicionado ao sucesso e lucratividade futuros dos negócios.

Para os credores, essa conversão pode representar uma alternativa atraente de recuperação judicial, especialmente em casos onde a falta de liquidez da empresa é percebida como temporária, permitindo-lhes, adicionalmente, participar nas decisões estratégicas da empresa em recuperação.

Do ponto de vista técnico, a conversão de dívida em ações pode ser efetivada por meio de várias modalidades, incluindo a compensação da obrigação de integralização do credor-acionista com a obrigação da empresa de pagar o montante equivalente em dinheiro. Pode ocorrer, também, pela extinção da obrigação do credor através da cessão do crédito à empresa, resultando na extinção da obrigação por confusão. A dação em pagamento do crédito à empresa, especialmente quando o crédito é representado por títulos ou valores mobiliários emitidos pela própria empresa, como debêntures, que podem ser mantidos em tesouraria para negociação futura, é outra forma de sua conclusão.

Embora a reforma da Lei 11.101 tenha formalizado a capitalização de créditos como um mecanismo de recuperação, ela não estabelece parâmetros específicos para a operacionalização da conversão de dívida em ações. O artigo 50, em seu caput, determina que a legislação aplicável deve ser observada em cada caso, implicando que todos os requisitos previstos na legislação societária para o aumento de capital devem ser cumpridos, incluindo a necessidade de deliberação dos sócios para a alteração do contrato ou estatuto social.

Portanto, uma vez aprovado o plano de recuperação judicial e identificados os credores interessados na conversão de seus créditos em ações, os administradores da empresa devem convocar uma assembleia geral extraordinária para deliberar sobre o aumento de capital, ou uma reunião do conselho de administração, caso a empresa possua capital autorizado, e essa competência lhe seja atribuída. Em resumo, esse aumento de capital necessita da aprovação dos acionistas ou do conselho de administração.

Este instituto certamente incentiva o mercado de aquisições agressivas, caracterizado por investidores especializados em reestruturar negócios em dificuldades, assumindo a gestão destas empresas e de seus ativos. Para esses investidores, é crucial a garantia de que não serão responsabilizados por dívidas anteriores ao pedido de recuperação judicial.

Para uma compreensão aprofundada da conversão de dívida em ações como meio de recuperação judicial, especialmente considerando a reforma da Lei 11.101, é essencial analisar a interação entre teoria e prática no dia a dia das negociações empresariais, conforme percebemos no dia a dia nosso escritório.

Paulo Roberto Vigna – Advogado, sócio do escritório Vigna Advogados Associados e da VignaTax Consultoria Fiscal e Tributária, Mestre em Relações Sociais do Direito, com MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas – FGV, pós-graduado em Direito Empresarial e em Direito Tributário pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, especializado em Gestão de Tributos pelo Instituto Trevisan (São Paulo).

Inscrito na seccional na ordem dos advogados do Brasil em Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Distrito Federal, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo e em Lisboa- Portugal.

Professor do curso de MBA em Gestão Estratégica Empresarial em São Paulo. É autor dos livros “Recuperação Judicial” e “Manual de Gestão de Contratos” e produz artigos sobre direito tributário, empresarial e tecnologia aplicada a ciência jurídica.

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