A figura do sócio investidor em sociedades limitadas

Segundo o Mapa de Empresas, do governo federal [1], das 7,5 milhões de sociedades empresárias ativas no Brasil, 7,2 milhões são sociedades limitadas, representando assim representa 96,26% do total. O segundo tipo societário mais utilizado, as sociedades anônimas — somadas as de capital aberto e fechado — representam 2,64% com 199.101 sociedades ativas. Os dados são atualizados mês a mês e, portanto, podem sofrer variações, mas se prestam a demonstrar a expressiva adoção da sociedade limitada por parte do empresariado brasileiro.

Apesar de não existir, no que tange à regulação das sociedades limitadas, qualquer tratamento legislativo ou menção àquele sócio que pretenda atuar como mero investidor, é possível traçar um paralelo com a previsão do sócio investidor, presente em outros tipos societários, a exemplo das sociedades anônimas, sociedades em conta de participação ou ainda as startups.

Sabidamente investidor é pessoa física ou jurídica que, assumindo riscos, aloca recursos em ativos ou atividades, com expectativa de colher resultados financeiros positivos.

As sociedades anônimas possuem o “capital social dividido em valores mobiliários representativos de um investimento (as ações), cujos sócios têm, pelas obrigações sociais, responsabilidade limitada ao preço de emissão das ações que titularizam” (COELHO, 2016, p. 88). Esse tipo societário, como leciona Marlon Tomazette (2014, p. 408), possui grande importância econômica como mecanismo de financiamento das grandes empresas e ao mesmo tempo como uma possibilidade de duplo ganho aos acionistas, por meio do recebimento de dividendos e pela negociação dos títulos valorizados no mercado.

Muito embora a Lei nº 6.404/76 não trate expressamente do investidor, percebe-se, especialmente nas sociedades anônimas de capital aberto, isto é, que negociam seus papeis no mercado de capitais, a existência da figura do acionista investidor, que não detém, e nem deseja, deter controle sobre a atividade, mas apenas aloca seus recursos na aquisição de papeis, que acredita lhe trarão retorno financeiro positivo.

Nas sociedades anônimas, a responsabilidade do acionista, inclusive o investidor, é limitada ao valor de emissão da ação, isto é, o acionista somente assume o risco de perder o valor investido, não pondo em risco seu patrimônio pessoal. Por valor investido, compreende-se o preço que se deve pagar para subscrever (adquirir) a ação (Tomazette, 2014, p. 407).

A sociedade em conta de participação, regida pelos artigos 991 a 996 do CC, classificada como sociedade despersonificada, portanto, desprovida de personalidade jurídica. Trata-se sociedade oculta, que tem por característica a existência de duas modalidades distintas de sócio, a saber, o sócio ostensivo, que exerce a atividade social em seu nome e sob sua inteira responsabilidade; e o sócio participante, oculto ou investidor, que não se mostra diante de terceiros, e apenas tem responsabilidades perante o ostensivo, no termo do ajustado entre eles.

Para Fábio Ulhoa Coelho, a sociedade em conta de participação “não passa de um contrato de investimento comum, que o legislador, impropriamente, denominou sociedade” (Coelho, 2016, p. 458).

Tal compreensão se justifica a medida que o sócio ostensivo, ao necessitar de recursos para exercer determinada atividade, socorre-se de investidores ou, no caso, sócios participantes. Do ponto de vista, dos sócios participantes, o investimento se mostra seguro, pois permanecerá oculto, já que a atividade será exercida exclusivamente pelo sócio ostensivo e sob sua inteira responsabilidade.

Marco Legal das Startups

Outra previsão acerca de investidores pode ser encontrada na Lei Complementar nº 182, de 1º de junho de 2021, que institui o Marco Legal das Startups e do empreendedorismo inovador, e que em seu artigo 4º considera startups “as organizações empresariais ou societárias, nascentes ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados” (Brasil, 2021).

Clayton Reis e Sandra Marlete Jankovski explicam que a startup possui como principais características a inovação, a escalabilidade e a flexibilidade e pode ser tida como uma “empresa em fase inicial que possui uma proposta de negócio inovadora e com um grande potencial de crescimento que podem atuar em qualquer área ou tipo de mercado e que normalmente utilizam a tecnologia como base de proposta” (Reis; Jankovski, 2023).

Em razão de sua proposta inovadora e disruptiva, a startup necessita de investimentos, e nesse sentido, o Marco Legal das Startups buscou conferir maior segurança jurídica aos investidores, a exemplo do que fez o artigo 8º, que assegurou que o investidor não será considerado sócio ou acionista, bem como não responderá por qualquer dívida da empresa, inclusive trabalhistas, tributárias e tampouco à hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica.

Clayton Reis e Sandra Marlete Jankovski concluem ainda que, embora o Marco Legal das Startups tenha contribuído para o aumento da segurança jurídica aos investidores, ainda há campo para melhoria, reduzindo-se “riscos externos derivados do mercado, a que se sujeitam quaisquer empresas; riscos internos decorrentes da assimetria informacional, ou seja, a desconexão entre as informações dos sócios/acionistas daquelas detidas pelo investidor; os problemas de agência” (Reis; Jankovski, 2023). Ainda assim, apesar dos desafios existentes, acreditam os autores que ainda há um grande mercado para as startups no Brasil.

PL nº 2.925, de 2023

Vale mencionar, ainda, que tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 2.925 de 2023, que segundo sua nota informativa [2], visa trazer aprimoramentos nos mecanismos de tutela dos interesses dos investidores e por consequência fomentar a confiança no mercado de capitais e na concessão de crédito fora do sistema bancário, por meio de alterações à Leis nº 6.385/76 e à Lei nº 6.404/76. Até a conclusão do presente trabalho o projeto de lei ainda não havia sido aprovado.

Nota-se a presença da figura do sócio ou acionista investidor em outros tipos societários, bem como um esforço legislativo em proteger os interesses dos investidores, de modo que não poderia ser diferente, no caso das sociedades limitadas.

Por ser o tipo societário mais utilizado e por oferecer responsabilidade limitada ao capital social, é natural que atraia o perfil de sócios investidores, que desejem alocar recursos financeiros próprios com o mero objetivo de colher no futuro recompensa positiva. Portanto, conclui-se que mesmo inexistindo previsão ou tratamento legislativo específico que regule o sócio investidor na sociedade limitada, não há dúvidas de sua presença e necessidade de proteção no cotidiano empresarial.

Por fim, a boa compreensão da figura do investidor mostra-se importante e evidencia a necessidade de proteção dessa figura, visando manter um ambiente econômico estável e favorável ao crescimento. Eventual receio de responsabilização desarrazoada pode levar investidores a evitarem aportes em empresas inovadoras ou em setores estratégicos, reduzindo o crescimento econômico afetando importantes índices econômicos, como número de empregos ou acesso a crédito.

Referências

BRASIL. Lei Complementar n. 182, de 1º de junho de 2021. Institui o marco legal das startups e do empreendedorismo inovador. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/LCP/Lcp182.htm.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial: Direito de Empresa. Volume 2. 20ª edição rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.

REIS, Clayton; JANKOVSKI, Sandra Marlete. Startups: Crise no empreendedorismo inovador? (Ou a batalha entre unicórnios e dinossauros?). Administração de empresas em revista, Curitiba, v. 3, n. 33, p. 839-863, Julho/.Setembro 2023.

TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: Teoria geral e direito societário. vol. 1, 6ª Ed. São Paulo: Atlas, 2014.

[1] Acessado em 03/02/2025. Disponível em: https://www.gov.br/empresas-e-negocios/pt-br/mapa-de-empresas/painel-mapa-de-empresas .

[2] Acesso em 03/02/2025. Disponível em: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/central-de-conteudo/publicacoes/notas-informativas/2023/agosto/nota-informativa-protecao-de-direitos-de-investidores-pl-2925-de-2023.pdf

Fonte: Conjur

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