O que muda com o fim da taxatividade do rol da ANS

O recente julgamento sobre a taxatividade do rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e recém aprovação de novo texto legislativo trouxe grande repercussão na seara do direito à saúde

O recente julgamento sobre a taxatividade do rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e recém aprovação de novo texto legislativo trouxe grande repercussão na seara do direito à saúde. Neste contexto, observou-se ampla mobilização social em torno do debate acerca da abrangência da cobertura dos planos de saúde. Nas redes sociais diversos artistas e ativistas se manifestaram de maneira contrária à taxatividade do rol da ANS, contribuindo para a visibilidade da temática.

O Rol de Procedimentos e Evento em Saúde da agência reguladora consiste em uma lista de tratamentos e terapias os quais as operadoras privadas são obrigadas a dar cobertura, levando em consideração a contratação segmentada realizada. A primeira enumeração se deu em 1998 e desde então houve a incorporação de novas previsões a partir do rito de atualização do rol.

Em retrospectiva, o embate de teses no julgamento do recurso EResp 1.886.929 do STJ, encerrado em junho, girava em torno do entendimento do rol ser taxativo ou meramente exemplificativo. Anteriormente, este último era o juízo predominante, o que significa dizer que outros tratamentos não indicados na lista poderiam ter assegurada a cobertura pelo plano ao se realizar a análise do caso concreto. Com a nova compreensão entendeu-se pela sua taxatividade.

Isto quer dizer que os planos de saúde não seriam mais obrigados a suportar com os custos de tratamentos não enumerados no rol da ANS para os casos em que existir outro procedimento que seja efetivo, havendo a possibilidade de ser facultado aos consumidores a ampliação da cobertura por meio de aditivo contratual.

Se por um lado o julgado teve como fundamento a segurança jurídica, além de visar a garantia de maior previsibilidade do risco com implicação nos preços das operadoras, por outro teve como consequência a restrição de procedimentos que não estão listados e interrupção de tratamentos em andamento, como alertado, por exemplo, pelas mães de criança com transtorno do espectro autista.

Os impactos do posicionamento da corte poderiam se estender a todos os consumidores que necessitam de procedimentos não incluídos na listagem e mais diretamente àqueles pacientes que carecem de tratamento especial, como de doenças raras, que demoram a ser incluídos no rol da ANS. Além disso, os reflexos não se restringem aos associados aos planos, mas na sociedade como um todo, já que reverbera na busca de intervenção médica junto ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Em movimento contrário à decisão do STJ, articulou-se na esfera legislativa modificação legal para a alteração do cenário vigente. O Projeto de Lei 2033/22 acaba de ser sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro sem vetos.

Segundo o texto, o rol de procedimentos e eventos da ANS é referência básica para os planos privados de saúde, sendo, no entanto, permitida a extensão da cobertura de tratamento e exames desde que respeite os critérios de comprovação da eficácia com base em evidências científicas e plano terapêutico, ou que exista recomendação pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) ou de outro órgão de avaliação de tecnologia em saúde com renome internacional.

A aprovação da lei permitirá maior flexibilidade ao acesso pelos pacientes a tratamentos que ainda não foram incorporados no rol, sendo, portanto, mais favorável aos consumidores, bem como dará subsídios para a discussão judicial nos casos de negativa de cobertura pelo plano e nos quais se verifique o preenchimento dos requisitos previstos. Contudo, apesar de sancionada a lei, as premissas que envolveram o embate no julgamento do STJ permanecem presentes, dando brecha a novas discussões futuramente.

Os desdobramentos da divergência de posicionamentos serão notados a partir da entrada em vigor da nova lei, sendo certo que a ausência de pacificação sobre o tema consequentemente levará novamente o debate ao poder judiciário.

Autor: Verônica Akemi Shimoida De Carvalho- advogada e mestre em Direito pela UFPR. Sócia do escritório Fachin Advogados Associados

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