Guerra Israel e Palestina: Urgência de uma solução global

Só ação concertada da comunidade internacional poderá sustar as agressões e criar condições para uma Palestina soberana.

Em meio a cenas de absoluto horror em Israel e Gaza, o presidente brasileiro publicou uma nota pessoal sobre o conflito no Oriente Médio. Nela, o Brasil faz um apelo em defesa das crianças palestinas e israelenses, pede o cessar-fogo na região e destaca a urgência de uma “intervenção humanitária internacional” diante da escalada de violência.

O Brasil ocupa lugar privilegiado nessa discussão. Tem histórico de boas relações com Israel e Palestina, faz comércio com ambos e sempre trabalhou pela superação do conflito no âmbito da ONU. Neste momento, ocupa a presidência do Conselho de Segurança e tem o poder de pautar a agenda do órgão.

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As próximas reuniões darão o tom da resposta internacional à guerra em andamento. Mas o consenso é difícil, até mesmo para criar um corredor humanitário que possa assegurar a saída dos palestinos pela fronteira egípcia. No momento, 1 milhão de palestinos ruma ao sul fugindo dos bombardeios israelenses — e o número de mortos em Gaza só aumenta.

Há algo de concreto que a comunidade internacional possa fazer a respeito? Uma solução que contemple o fim da violência e renove as condições para que os palestinos tenham seu próprio Estado não é só necessária, como também urgente. Esse foi o paradigma que guiou os Acordos de Oslo, em que lideranças israelenses e palestinas, sob os olhos atentos do mundo, deram passos concretos para tal fim.

Mediadas pelos Estados Unidos, as conversas de Oslo produziram avanços importantes. Criaram a Autoridade Palestina, garantiram sua autonomia sobre áreas da Cisjordânia e de Gaza e estabeleceram parâmetros para a resolução dos temas mais espinhosos — o status de Jerusalém, a questão dos refugiados palestinos e os arranjos específicos de segurança.

Trinta anos depois, a situação retrocedeu a passos largos. A progressiva construção de assentamentos judaicos ilegais na Cisjordânia torna praticamente impossível que ali se instale um Estado palestino. O fortalecimento do Hamas e de sua estratégia de terrorismo inviabiliza qualquer diálogo racional entre israelenses e palestinos que querem a paz, mas vivem pautados pelo medo. Menos apoiam a solução de dois Estados hoje que no passado.

O quadro só se agrava diante de sociedades absolutamente fraturadas. Israel vive a maior crise política de sua história, marcada pela pulverização das forças políticas, pela radicalização dos governos e por protestos populares contra o premiê Benjamin Netanyahu. Brutalizados pelo Hamas e pela prolongada ocupação e frustrados com suas próprias lideranças políticas, os palestinos não conseguem vislumbrar qualquer perspectiva de independência.

Mais do que nunca, a comunidade internacional deverá agir de maneira construtiva. Sabemos que a mediação americana é indigesta para os palestinos e para muitos outros países que, compreensivelmente, veem nos americanos uma força pró-Israel. Mesmo que os Estados Unidos sigam na equação, fica claro que eles não poderão mais atuar sozinhos.

Há precedentes para a participação de outros países na busca de uma solução. A Liga Árabe ofereceu um plano de paz em 2002 e 2007, com apoio dos Estados Unidos. As poucas negociações que avançaram desde Oslo ocorreram no marco do Quarteto, quando americanos trabalharam em conjunto com outros atores: Rússia, União Europeia e ONU.

O mundo multipolar de hoje abre oportunidade para a participação de outros países. Aí se inscreve a atuação da diplomacia brasileira. Ainda não se sabem os detalhes da “intervenção humanitária” anunciada pelo Brasil. Mas a escolha das palavras, algo nunca trivial na diplomacia, mostra que o Brasil quer assumir outro tipo de protagonismo.

Nestes tempos de apreensão e sofrimento, somente uma ação concertada da comunidade internacional poderá sustar as agressões e criar condições para a criação de uma Palestina soberana. É imprescindível quebrar o ciclo de violência. Para isso, as nações comprometidas com a paz deverão considerar seriamente um grande esforço humanitário no terreno, que desmobilize extremistas e abra caminho ao diálogo.

Autor: Guilherme Casarões – Pesquisador Sênior do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI). É professor da FGV EAESP, doutor e mestre em Ciência Política pela USP e mestre em Relações Internacionais pela Universidade Estadual de Campinas. Pesquisa temas ligados a política externa brasileira, política latino-americana e a ascensão da extrema direita no Brasil e no mundo. Foi visiting fellow da Universidade de Tel Aviv, em Israel, e da Universidade Brandeis e da Universidade de Michigan, nos EUA.

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