Novas regras trazem mais segurança na cessão de precatórios

Uma recente alteração legislativa traz importantes mudanças nas regras de garantia e execução extrajudicial de créditos, o chamado Novo Marco de Garantias. A ideia é facilitar o uso das garantias de crédito, reduzir custos e juros de financiamentos e aumentar a concorrência.

Promulgada no último dia 30 de outubro, a Lei 14.711/2023 tem o objetivo de dar mais segurança jurídica e transparência a esses processos. Entre as alterações promovidas, destacam-se aquelas que detalham a negociação e cessão de precatórios — dívidas do poder público reconhecidas pela Justiça e com sentença transitada em julgado. 

Segundo o artigo 6º-A, introduzido à Lei 8.935/1994, os tabeliães de notas estão obrigados a comunicar o juízo competente a existência de qualquer negociação em andamento para a transferência de um precatório ou crédito judicial reconhecido em sentença definitiva. Essa comunicação deve ocorrer a pedido das partes envolvidas e precisa ser feita de modo imediato. A cessão só terá efeito se, em até 15 dias após o juízo ser informado, for registrada a escritura pública correspondente à cessão do crédito.

O tabelião terá o prazo de três dias úteis, após a assinatura da escritura, para informar ao juízo sobre a cessão. Além disso, os tribunais são instruídos a fornecer aos tabeliães acesso a um sistema ou banco de dados para consultar informações não sensíveis sobre o crédito e o número de cadastro de contribuinte do credor, o que é fundamental para garantir a transparência e a agilidade do processo.

Com a introdução do artigo 7º-A, os tabeliães de notas agora podem executar atividades como a certificação do cumprimento ou não de condições negociais e atuar como mediadores, conciliadores ou árbitros em transações. Isso amplia o escopo do trabalho dos tabeliães, permitindo que eles desempenhem um papel mais ativo e versátil em diversos aspectos dos negócios jurídicos. Tais inovações têm o desejável potencial de desafogar o Poder Judiciário de demandas relacionadas ao tema.

Os valores negociados podem ser recebidos ou depositados por meio do tabelião, que será responsável por repassar o montante à parte devida após verificar as condições do negócio. Importante ressaltar que os depósitos vinculados à negociação não podem ser bloqueados por autoridades judiciais ou fiscais por dívidas que não estejam relacionadas ao negócio em questão.

O depósito não poderá ser feito em uma conta vinculada ao negócio, mas em uma espécie de “conta escrow” (ou conta garantida). Isso é especialmente relevante em negociações de grandes valores, quando se tratar de uma compra e venda para compensação em transação porque, diferentemente de uma conta de livre movimentação, a “conta escrow” não fica à disposição do seu beneficiário. Então, embora o comprador do precatório faça o depósito, recurso só é efetivamente liberado para o vendedor após a concretização da transação.

Além disso, as atas notariais que atestam a ocorrência ou a frustração das condições negociais servem como certificação para o repasse dos valores devidos e podem se tornar título executivo, conforme previsto no artigo 221 da Lei de Registros Públicos.

A nova lei resolve uma questão que tem sido motivo de controvérsias jurídicas e está alinhada à jurisprudência predominante dos tribunais, segundo a qual o primeiro comprador do precatório a protocolar a cessão é o efetivo titular. Agora este problema deverá ser eliminado, permitindo que as cessões que utilizarem escritura pública desafoguem o Judiciário de mais essa demanda.

Com essas atualizações, o legislador pretende preencher a lacuna de confiança que impede a massificação das transações com precatórios, abrindo esse mercado secundário ao cidadão comum. Além disso, fortalece a função dos serviços notariais, garantindo que atuem como agentes efetivos na segurança e na formalização dos negócios jurídicos. A transparência, a agilidade processual e a proteção ao patrimônio das partes envolvidas são os principais pilares dessas inovações legislativas.

Mesmo com as mudanças de regra que melhoram o risco de um terceiro adquirir o precatório durante uma negociação, vale ressaltar que as três principais regras de cautela continuam válidas: precatório não garante pagamento e recomenda-se a contratação de uma auditoria para analisar o processo judicial em si; quem oferece a operação (originador, vendedor ou intermediário) nunca deve ser o auditor, visto que existe um enorme conflito de interesses — a não ser que o originador e/ou auditor sejam também investidores; e, finalmente, em casos de maior valor, além da auditoria processual, deve-se realizar uma importante auditoria contábil e financeira, desde o valor originário da condenação judicial.

Autores:

Andrey Guimarães Duarte é tabelião de notas, presidente Associação dos Titulares de Cartório de São Paulo e vice-presidente do Colégio Notarial do Brasil — seção São Paulo.

Pedro Corino é CEO da São Paulo Investimentos, mestre em Direito pela PUC-SP, professor e pesquisador.

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